Suposta fraude da InovePay envolvendo milhões de reais impacta setor de material de construção

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Um suposto esquema financeiro fraudulento envolvendo a InovePay (I9Pay ou Inove Banco) resultou em prejuízos para mais de 2.600 estabelecimentos comerciais de diversos setores. A situação teve início com a deflagração da Operação Concierge, em agosto de 2024, e já acumulou um processo de mais de 65 mil páginas, incluindo 25 páginas de petições que detalham as irregularidades identificadas. O bloqueio das atividades da InovePay revelou uma rede de operações financeiras irregulares, levantando suspeitas de gestão fraudulenta, lavagem de dinheiro, crime organizado e operações similares a uma pirâmide financeira. Segundo estimativas dos empresários, o prejuízo, que ainda está sendo apurado pelas investigações, pode chegar a uma cifra de R$ 800 milhões.

Inicialmente, os pedidos de ressarcimento de valores vinham tramitando na Justiça Federal. Contudo, devido à sua complexidade, a determinação judicial atual orienta que as empresas prejudicadas deverão buscar o Juízo Cível, conforme consta nos autos do processo. De acordo com Ricardo Augusto Marchi, da Marchi Advogados e representante da Federação Brasileira de Redes Associativistas de Materiais de Construção (Febramat), o descontentamento dos empresários é evidente. Muitos apontam a falta de transparência da InovePay e da Adiq Pagamentos, a morosidade do processo e a incerteza quanto à recuperação dos prejuízos.

Destino de recursos da InovePay bloqueado é questionado

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“Um único empresário do setor de material de construção, em São Paulo, teria mais de R$ 5 milhões a receber”, Ricardo Augusto Marchi, da Marchi Advogados.

O advogado ressalta que apenas um único empresário do setor de material de construção, em São Paulo, teria mais de R$ 5 milhões a receber. A falta de transparência nos pagamentos da Adiq Pagamentos, a instituição credenciadora responsável por intermediar as transações da InovePay, agrava ainda mais a situação. Há dúvidas sobre o paradeiro dos recursos, que podem ter sido utilizados indevidamente. “Não sabemos ao certo onde está o dinheiro: se ficou com o Adiq, com o InovePay ou foi desviado. Além disso, o InovePay atuava como banco sem autorização, oferecendo serviços de antecipação de recursos, empréstimos e seguros”, afirma.

“São mais de 2.697 estabelecimentos que precisam receber. Além disso, há uma particularidade no setor de material de construção, que vende parcelado. Existem empresas com uma boa parte do faturamento de 12 meses comprometida com a InovePay”, destaca o advogado. Ele explica que em meados de novembro, a Adiq se manifestou nos autos, informando que já havia feito os pagamentos referentes aos dias 28 e 29 de agosto e que, dos cerca de 47 milhões bloqueados, o restante foi adiantado para a InovePay. No entanto, constatou-se que o InovePay tinha apenas 18 milhões de reais na caixa. “Onde está o restante do dinheiro? Não temos esse número preciso, mas as estimativas indicam que o montante do rombo chegue a algo em torno de R$ 800 milhões”, conclui Ricardo Marchi.

O impacto da Inovepay no setor de material de construção

A relação da InovePay com o setor de material de construção teve início na Feicon de 2024, maior feira do segmento na América Latina. Uma parceria com benefícios promissores havia sido apresentada às entidades do setor, como à Fecomac SC (Federação das Associações dos Comerciantes de Material de Construção de Santa Catarina), que representa 9.200 lojas. A proposta envolvia a oferta de máquinas de cartão com taxas atrativas para os lojistas associados. Contudo, a parceria resultou em prejuízos generalizados. “Fomos surpreendidos em agosto, quando lojistas relataram que não conseguiam acessar o portal da operadora de cartão. As informações haviam desaparecido”, relatou Rodrigo Nandi, presidente da Fecomac SC.

De lá para cá, Rodrigo Nandi tem se reunido regularmente com representantes de onze Associações de Comerciantes de Material de Construção (Acomacs) dos estados de Santa Catarina, Espírito Santo, Minas Gerais e Paraná para buscar soluções e minimizar os prejuízos.

Rodrigo Nandi Fecomac SC
“O setor de material de construção é particularmente afetado por trabalhar com valores altos e prazos longos de parcelamento”, Rodrigo Nandi, presidente da Fecomac SC.

Rodrigo Nandi ressalta o impacto financeiro da situação no setor de material de construção: “Esse setor é particularmente afetado por trabalhar com valores altos e prazos longos de parcelamento. Imagine uma venda de R$ 1 milhão parcelada em 10 vezes: no primeiro mês, o lojista deveria receber R$ 100 mil, enquanto os R$ 900 mil restantes ficam para pagamento futuro. Alguns lojistas que optaram pela modalidade de recebimento d+2 obterão uma parte do valor, mas precisarão pagar taxas adicionais. Para esses, o InovePay inicialmente parecia ser uma boa solução. No entanto, muitos outros estão enfrentando sérias dificuldades.”

Ele exemplifica: “Uma loja que tinha R$ 2 milhões para receber contava com seu fluxo de caixa para que cerca de R$ 200 mil entrassem mensalmente. Mas o primeiro mês não entrou nada, o segundo também não, e agora já estamos há cinco meses nessa situação. Isso significa R$ 1 milhão de prejuízo acumulado. As mercadorias foram vendidas, os vendedores já receberam suas comissões, o governo já recolheu os impostos, mas o lojista não tem os recursos necessários para honrar seus compromissos.”

Desdobramentos da Operação Concierge

A Operação Concierge, que segue apurando os fatos, revelou um possível esquema de fraudes financeiras que alcançam R$ 7,5 bilhões em operações ilegais. Entre os presos está Patrick Bezerra Burnett, fundador da InovePay, acusado de liderar a operação. A investigação identificou a utilização de “bolsões” financeiros – contas bancárias utilizadas para mascarar transações e dificultar o rastreamento dos recursos. A Operação Wolfie, iniciou a partir de documentos apreendidos na Concierge e investiga a tentativa de fraude de 300 milhões no BNDES, deflagrada em outubro de 2024. A análise de dados constatou que uma das fintechs  – bancos digitais não eram autorizados pelo Banco Central para atuar no Sistema Financeiro Nacional – investigadas (Inove Banco e a T10 Bank) havia protocolado um pedido de financiamento junto ao BNDES dias antes da deflagração da operação. O objetivo era a aquisição de um banco autorizado pelo BACEN.

Enfim, a fraude é abrangente e não apenas afetou lojistas, mas também gerou impacto em toda a cadeia de fornecimento e nos empregos vinculados aos setores, especialmente o de material de construção com vultosas quantias a receber. Muitos estabelecimentos que comercializaram produtos de forma lícita agora enfrentam o risco de insolvência devido à falta de recebimento das vendas realizadas. As entidades representativas do setor continuam mobilizadas para reaver os valores e minimizar os danos aos lojistas.

Nota de defesa da InovePay sobre decisão judicial e bloqueio de contas

Em nota, o escritório Fernando José da Costa Advogados, que representa a InovePay declarou: “É importante esclarecer que, desde o dia 28/09/2024, a empresa InovePay, bem como outras 193 empresas, foram questionadas com a decisão judicial precipitada do Juízo da 9ª Vara Federal de Campinas que determinou a suspensão de suas atividades empresariais, bem como o bloqueio de suas contas bancárias. Contudo, com o decorrer das investigações, o mesmo juízo tacitamente assumiu o equívoco inicial das referidas medidas e determinou o desbloqueio da conta bancária da InovePay, atribuindo à ADIQ, adquirente responsável, a função de fiel depositário dos valores e responsável pelo seu repasse aos estabelecimentos. Nesse contexto, desde a data da suspensão, a InovePay não possui qualquer ingerência sobre os valores que seguem constritos em sua conta.”

A Anamaco (Associação Nacional dos Comerciantes de Material de Construção) tem acompanhado de perto a situação e se preocupa com o impacto para os lojistas. O presidente da entidade, Cassio Tucunduva, reforça: “É essencial que os prejuízos sejam ressarcidos e que os responsáveis ​​sejam responsabilizados para que o setor volte a operar com segurança e estabilidade.”

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